domingo, 25 de março de 2012

NOSSO ESTRANHO AMOR

Já repararam em como tem um tanto gente reclamando da solidão? Querendo achar a goiabada pro seu queijo, a tampa pra sua panela, o guaraná pra sua pipoca, o granulado pro seu brigadeiro? Como explicar tantas pessoas querendo a mesma coisa e elas não se esbarrarem por aí? Que diacho de análise combinatória é essa que não dá certo?!

Um dos meus palpites é que nestes tempos ciberneticamente rápidos, as metralhadoras giratórias disparam freneticamente sem observar de verdade o alvo. Saciam-se os desejos e alimentam-se os vazios. E, ainda, parece que não queremos dispender muito tempo nem paciência pra nos envolver afetivamente com o outro. Se afetar com outro. Imagina então o ônus que seria viver uma história de amor.

A Clarice disse que amor não é prêmio e por isso não envaidece. Talvez seja mesmo preciso ficar nu para viver o amor. Tirar a roupa pode ser a parte mais fácil. Difícil mesmo é desnudar-se. Nu. Apenas com nossa beleza e nossa feiura mais autênticas. Temos tempo e disposição pra administrar essa nossa humanidade toda? Definitivamente, o amor suja as mãos.

Ainda sim, sou um romântico incurável (e um pouco cafona, por isso). O amor dá trabalho sim, (não há como fugir disso), mas também pode te fazer tão melhor. E olha que não tô falando de um amor desses de cinema não. É desse amor do dia-a-dia mesmo. Que vai ao banco, toma neosaldina e come pizza dormida. Que tem tesão, assanhamento, safadeza e também um cafuné distraído no cabelo. Que te manda uma mensagem no meio do dia e que também quer ficar sozinho nessa sexta, simplesmente porque quer. Que te detesta quando você rói a unha e se derrete quando você dá aquela sua gargalhada esquisita. Que teve um dia péssimo no trabalho hoje e está irritado, mas que amanhã passa. Que fica engraçado quando eventualmente está de mau humor, mas que tem humor, porque isso é indispensável. Que foi tão inesperado e que é muito e tão bem vindo.

Tem quem não me deixa mentir: Vinicius foi, no reveillon, ver os fogos em Copacabana, mas quem brilhou mesmo foram os olhos da sua paixão. Nádia deu voltas longas em torno da Terra e encontrou o homem da sua vida e o pai da sua filha no amigo da mesa ao lado, no trabalho. Juninho teve um mal súbito na Praça Sete e quem o socorreu o acompanha pela vida afora. Não é história de filme e nem acontece pra todo mundo, mas existe amor. Com seus ônus e seus bônus. De verdade. De realidade.

Desconfio que, mais cedo ou mais tarde, ele aparece pra quem consegue se desnudar. O amor, esse difícil estranho, está a espreita pra quem tem olhos atentos para vê-lo.

12 comentários:

  1. Que bacana! Esse "mau súbito" realmente foi um "Ótimo Súbito" e lá se vão 10 anos e 2 meses. Ao parabenizá-lo pelo texto, aproveitamos a oportunidade para te agradecer a homenagem. Adoramos.
    Bjos
    Juninho e César

    ResponderExcluir
  2. Simplesmente maravilhoso! Vou roubar e postar no meu blog! Arrasou, Paulo! Beijo!

    ResponderExcluir
  3. "Um dos meus palpites é que nestes tempos ciberneticamente rápidos, as metralhadoras giratórias disparam freneticamente sem observar de verdade o alvo. Saciam-se os desejos e alimentam-se os vazios. E, ainda, parece que não queremos dispender muito tempo nem paciência pra nos envolver afetivamente com o outro. Se afetar com outro".

    um texto melhor do que outro... sempre! adoro o jeito que escreve... tão claro, direto e ainda assim tão cheio de emoção!
    o que as pessoas menos querem é se sentir afetada ou ver que está afetando o outro... é incômodo!
    adorei o verbo afetar... afeto é isso né?!
    vou postar isso no face com os devidos créditos!
    abraço

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Cris Cris, sempre tão carinhosa! Adoro sua presença! Bjo

      Excluir
  4. Delícia cada palavra. Lembrei do papo de "rê-conhecimento" que tivemos no Café com Letras. Pega na minha mão e vamos desbravar juntos os mistérios que escondemos de nós mesmos?

    ResponderExcluir
  5. Uma amiga me apresentou seu blog, eu apresentei a esperança que este texto me deu pro meu coração. Vou continuar lendo você, e antes que eu me esqueça, o sr. até que escreve bem :)

    ResponderExcluir
  6. Lindíssimo texto!Amei de verdade!
    Parabéns pelo blog e muito sucesso,sempre!
    Voltarei mais vezes!
    Um beijo

    ResponderExcluir
  7. Fiquei tanto tempo sem passar por aqui, e com esse texto lindo tenho a certeza que não posso deixá-lo de lado. Adoro seu blog!

    ResponderExcluir